Poderão os designers serem substituídos por robots?

Sejamos claros: todas as funções e tarefas que podem ser substituídas por robots, sê-lo-ão. Mais cedo do que tarde.

Escrito com ❤️ a

13 de Maio, 2020

Para muitos de nós o primeiro vislumbre do futuro foi com os desenhos animados «The Jetsons» que passaram em abundância na televisão entre os anos 80 e 90. A premissa desta séria é simples: nela acompanhamos o dia a dia da família Jetson que vive numa cidade onde todos os edifícios estão suspensos do chão, viaja em carros voadores e tem robots para quase tudo. O patriarca, o George Jetson é empregado da Spacely Space Sprockets e trabalha 1 hora por dia, 2 dias por semana. À época este futuro parecia, de tão inovador, muito distante. Hoje, o futuro dos Jetsons parece-nos um pouco antiquado – então o George Jetson tem de conduzir o seu carro? Ainda não tinham carros autónomos?

Quando falamos de robots substituírem humanos tendemos a achar que isso é ainda um futuro muito distante. Não nos apercebemos que tal tem vindo a acontecer em abundância, talvez por uma questão de semântica, porque não associamos que uma máquina ou um robot podem ser exatamente a mesma coisa. Por exemplo: dizemos «vou à máquina do Multibanco», mas aquele «aparelho» é mais do que uma máquina, é um robot que substituiu em dezenas de tarefas o trabalho do empregado bancário, como entregar dinheiro, receber depósitos ou fazer transferências.

Não são apenas robots físicos que têm vindo a substituir os humanos. Na verdade, a maioria dos robots que gerem o nosso dia a dia são invisíveis, pois são constituídos por pedaços de código informático sofisticado capaz de lidar com milhares de milhares de dados e tomar, numa fracção de segundos, milhares de decisões. Veja o exemplo das transações na Bolsa de Nova Iorque, onde mais de 60% desse mercado de ações é controlado por fundos cujas estratégias de compra e venda são geridas e comandadas via software – os investidores robots (investing robots). Leia este artigo do Jornal de Negócios sobre como os robots foram fundamentais para manter as bolsas em funcionamento durante a actual pandemia uma vez que permitiram colmatar a ausência de trabalhadores.

O que está a acontecer a uma velocidade vertiginosa é que estes robots estão a ficar cada vez mais sofisticados, mais capazes e mais certeiros. Em suma: mais inteligentes. E vou definir inteligência como sendo a capacidade para lógica, abstração, memorização, compreensão, comunicação, aprendizagem, planeamento e resolução de problemas. Os robots estão a ser capazes de fazer tudo isto. Mesmo que em alguns casos ainda não sejam melhores do que os humanos, a realidade é que se estão a aproximar, sendo que às vezes nem precisam de o ser. Por exemplo, um carro autónomo pode não conduzir melhor que um humano em certas condições, mas se de um modo geral reduzir os acidentes de viação em 90% (como se estima) então torna-se uma razão muito forte para a sua adopção massiva.

Então, a resposta à pergunta deste artigo é simples: sim, os robots poderão (ou já estão) a substituir os designers e técnicos que fazem parte de um projeto criativo.

Design orientado ou realizado por robots tem o potencial de remover um conjunto significativo de tarefas feitas por designers, especialmente aquelas rotineiras ou com pouco potencial criativo, como adaptar uma campanha publicitária para várias línguas ou culturas diferentes (como traduzir headlines e textos informativos ou substituir pedaços de imagem, como trocar uma foto de Lisboa por uma de Paris); pegar em 1000 produtos e organizá-los autonomamente por categoria num catálogo comercial, acrescentando automaticamente as informações necessárias como preço ou características; ou editar automaticamente um vídeo, escolhendo as melhores cenas e planos (aliás, hoje qualquer smartphone já faz isso!). Um robot será capaz de lidar com estas (e outras) tarefas rotineiras de forma autónoma, permitindo as agências publicitárias operarem com menos pessoas e aumentarem o volume de trabalho.

A Adobe, líder mundial incontestável na criação de ferramentas criativas para designers e não só, já tem um software que usa o poder da inteligência artificial (IA) e do machine learning para facilitar tarefas rotineiras como edição de vídeo e imagem de forma a simplificar o processo criativo e a tomar decisões bem-informadas. O Adobe Sensei promete ampliar a capacidade de criar e oferecer experiências personalizadas que antecipam as necessidades dos clientes.

E no tipo de trabalho mais conceptual ou criativo? Creio que os robots também serão capazes de o fazer. Já existem exemplos de robots que são capazes de criar música sem que a maioria das pessoas se apercebam que foi gerada por software. O mesmo pode acontecer para o trabalho de ilustração, em que definido o estilo, o tema, as cores, o traço, o robot produz o desenho, que para a maioria das pessoas é satisfatório. Ou no desenvolvimento de um conceito para uma campanha publicitária, onde introduzidos os dados como público-alvo e características do produto, o robot criativo apresentará sugestões de headlines, textos descritivos, imagens elaboradas com a presença do produto, etc. E se não estiver satisfeito, será possível pedir ao robot propostas infinitas.

A consequência é que haverá um conjunto de produtos e serviços de design que deixarão de ser valorizados e cujo custo será uma fracção por ser realizado por robots. Para a maioria, este tipo de trabalho criativo realizado por robots é o suficiente para as suas empresas, negócios ou projetos pessoais. Os restantes, aqueles que desejarão um trabalho manual e idealizado por pessoas, na tentativa de «ultrapassar as máquinas», estarão dispostos a pagar bom dinheiro para obterem esse tipo de resultado. Como tudo na vida, o espaço para esse tipo de designers e criativos será do tamanho de uma casca de noz.

Sejamos claros: todas as funções e tarefas que podem ser substituídas por robots, sê-lo-ão. Mais cedo do que tarde. O que é necessário para continuarmos relevantes no mercado de trabalho é adaptar-nos, tal como temos vindo a fazer deste a introdução da máquina a vapor.

Creio que os designers em geral conseguirão adaptar-se, pois estão equipados com a competência mais importante, que é a criatividade, que lhes dá uma enorme flexibilidade de aprenderem, de se reinventarem e de resolverem problemas. É obvio que esta robotização trará enormes consequências económicas para as pessoas que ficam sem ocupação. E por isso a tomada de consciência da necessidade de uma aprendizagem e formação contínua é essencial para se manter capaz de competir num mercado de trabalho cada vez mais inovador.

Quer levar estas reflexões consigo?

You've Got M@il: reflexões sobre design, criatividade, carreira e negócios

Se gostou deste artigo, vai querer mergulhar em You’ve Got Mail. Este livro nasceu da vontade de reunir num só lugar as ideias e reflexões que tenho partilhado ao longo dos anos — sobre criatividade, tecnologia, estratégia, carreira e tudo o que acontece quando estas áreas se cruzam.

Mais do que uma compilação de textos, You’ve Got Mail é um convite à leitura com tempo: para sublinhar, repensar caminhos e voltar sempre que precisar de foco ou inspiração.

Outros artigos

O que aprendi ao usar o ChatGPT ao longo de dois anos

Há dois anos, o ChatGPT parecia um superpoder: uma mente incansável, sempre pronta a responder, a criar, a resolver. Mas entre a euforia e a dependência, percebi algo inquietante — quanto mais fácil tudo se tornava, menos prazer eu sentia em fazer. A verdadeira questão já não é o que a máquina é capaz de fazer, mas o que nós estamos a deixar de fazer.

Continuar a ler

Dois ingredientes para 2021: Empatia e Calma

Embora 2020 se esteja a aproximar do fim, não significa que os desafios que vieram com ele também estejam a terminar. Ainda vamos sentir os seus efeitos por muito tempo. Usemos de empatia e calma para ultrapassarmos os velhos e os novos desafios que se adivinham.

Continuar a ler