Não sei se alguma vez visitou um estúdio de gravação de som. Quando entra na sala de captação e fecha a porta a primeira sensação que tem é de um silêncio absoluto. Não se consegue escutar nada do que se passa no exterior, ao mesmo tempo que a nossa própria voz não ecoa em nenhum canto, parecendo que o som é incapaz de se propagar.
Eu já tive a oportunidade de experimentar um espaço assim, no qual se ficarmos quietos e calados, conseguimos ouvir, literalmente, o silêncio e os nossos pensamentos. Para alguns esta experiência pode até nem ser cómoda, para mim é de enorme conforto.
Acredito que à medida que avançamos na idade aprendemos a apreciar cada vez mais o silêncio, especialmente quando se vive na grande cidade e se é obrigado a conviver com todo ruído que polui o ambiente.
Mas não é só o ruído da cidade que dificulta a concentração e o ato de pensar claro. Estamos constantemente a encher os ouvidos de música, de informação e entretenimento de TV, rádio ou podcasts, e claro, das mil e uma conversas em redor que invadem o nosso espaço e interrompem o pensamento, distraindo-nos ou tirando-nos a calma e a tranquilidade que necessitamos para estar concentrados.
As distrações e interrupções são tão comuns no dia a dia de trabalho que já nem pensamos nelas como forma de ruído excessivo. Mas a verdade, é que tudo isto dificulta, e muito, a criação de alguma coisa de valor.
Numa experiência realizada com o objetivo de analisar a forma como o cérebro reage a diferentes tipos de música, concluiu-se que o silêncio provocou maior relaxamento no nosso cérebro do que a chamada música relaxante!
São várias as evidências científicas sobre o benefício do silêncio para o nosso corpo e mente, mas o silêncio é também fulcral para a criatividade e resolução de problemas complexos e na tomada de decisões difíceis.
Veja o exemplo do compositor e fundador da CDBaby, Derek Sivers. Num artigo publicado no seu website, explica como tirar tempo para ficar sozinho, longe do ruído do mundo, permitiu-lhe os melhores momentos criativos.
«Então percebi que todos os melhores, mais felizes, e mais produtivos momentos da minha vida, foram aqueles em que estava completamente desligado. Sem Internet. Sem TV. Sem telefone. Sem pessoas. Uma longa solidão ininterrupta. O silêncio é uma óptima tela em branco para os teus pensamentos.»
Necessitamos, urgentemente, de substituir o ruído pelo silêncio.
É verdade que para a maioria pode ser desconfortável, pois o instinto será lutar e pensar que é uma perda de tempo. Mas esse momento de silêncio dar-lhe-á a oportunidade de acalmar todas as tempestades emocionais, permitindo processar a informação e refletir sobre a melhor decisão, elaborando estratégias e avaliando os resultados.
Susan Cain defendeu na sua TED Talk que a riqueza criativa surge da solidão e pede, pelo bem de todos, que se pratique a introversão: «Sempre me disseram que eu deveria ser mais aberta, embora sentisse que ser introvertida não era algo mau. Temos a crença de que toda criatividade e produtividade vêm de um lugar particularmente sociável. Só que a solidão é o ingrediente essencial da criatividade. Darwin fazia longas caminhadas pelo bosque e recusava enfaticamente convites para festas. Steve Wozniak inventou o primeiro computador Apple sentado sozinho num cubículo na Hewlett Packard, onde então trabalhava. Solidão é importante. Para algumas pessoas, inclusive, é o ar que respiram.»
Ela lembra ainda que quando estão rodeadas de gente, as pessoas limitam-se a seguir as crenças dos outros, para não romperem a dinâmica de grupo. A solidão, por sua vez, significa abrir-se ao pensamento próprio e original. Reclama que as sociedades ocidentais privilegiam a pessoa ativa à contemplativa.
O silêncio diz muito mais do que as palavras e é através dele que a criatividade se manifesta na sua melhor forma.