É comum pensar-se que criativos, designers ou artistas em geral são pessoas perfeccionistas e obsessivas com os mais ínfimos detalhes. O perfeccionismo tem o poder de atrair e de repelir ao mesmo tempo. Se é verdade que sentimos assombro pela capacidade de detalhe de um perfeccionista, também é certo que muitos teriam um esgotamento nervoso se tivessem de lidar com alguém assim todos os dias.
É habitual dizer-se que o perfeccionismo faz-nos melhores, pois significa que valorizamos um trabalho de qualidade, damos atenção aos pormenores, que ambicionamos um padrão de valor acrescentado. Mas, o perfeccionismo pode destruir a criatividade e a produtividade.
Se há uma certeza que podemos ter na vida é que nada é perfeito. E escusado será dizer que a maioria dos artistas, criativos e designers são os seus piores críticos, pois as expectativas irrealistas onde colocam o seu trabalho, são isso mesmo, irrealistas e por isso, nunca são capazes de estarem satisfeitos com o que produzem. Para um perfeccionista o trabalho nunca está terminado e por isso não é capaz de concluir e chegar a um fim.
Talvez pudéssemos aprender alguma coisa com o cineasta de animação Hayao Miyazaki que afirmou que «chegar ao fim da produção um filme é saber que logo a seguir me irei arrepender com o resultado final. Eu olho para os filmes que fiz e tudo o que vejo são falhas… a menos, que comece a trabalhar num novo projeto para ver-me livre da maldição do anterior».
Criativos perfeccionistas são criativos tristes. Por isso a lição que é necessária aprender é que como criativo é melhor abraçar a imperfeição do que esperar a perfeição, pois ela não existe. Todos os rostos são assimétricos. Todas as árvores têm um ramo quebrado. Todos os cantores desafinam em alguma nota. E mesmo nos melhores projetos de design encontraremos um pixel fora do lugar!
E se pensarmos bem, não faz sentido um designer lutar pela perfeição! Pois sem a imperfeição, não haveria motivos para melhorar ou aprender. A criatividade é alimentada pela imperfeição que observamos no mundo e desse modo, temos a oportunidade de reinventar o que nos rodeia, num círculo virtuoso de desafio constante para corrigir e aperfeiçoar.
Admito que nunca fui um perfeccionista. Não significa isso que não faça bem o meu trabalho e com brio. Assim, como não significa que fique sempre satisfeito com o resultado. Denota antes que sei concluir o trabalho, isto é, declarar que o que está feito, feito está e que na próxima oportunidade utilizarei essa experiência para fazer melhor.
Eu gosto de terminar os meus trabalhos rapidamente, especialmente quando estou confiante no instinto da primeira ideia. Quando sei que estou no caminho certo fecho a porta a dúvidas e incertezas. Posso admitir que não é a ideia mais brilhante do mundo e que até lhe falte originalidade, mas se é viável e cumpre os requisitos, então não vale a pena continuar atrás do desconhecido. A mesma coisa com a execução: se satisfaz e não sinto vergonha nem embaraço, então posso deixar como está.
Se é suficientemente bom, se é um resultado minimamente apreciável, se consegue gerar empatia com o público-alvo a que se destina, então significa que está pronto para concluir, mesmo que ainda sejam dados alguns retoques ou aperfeiçoamentos, tenho plena consciência, que terei um trabalho pronto antes de esgotar o prazo final. Saber quando um trabalho está suficientemente bom não é dizer que o padrão de qualidade é baixo e que se falta ao respeito com o cliente e com o público-alvo.
Nestas férias de verão li o livro «O Labirinto dos Espíritos» de Carlos Ruiz Zafón, um dos meus autores de ficção prediletos. Li todos os livros dele! Esta obra em particular tem 850 páginas… 850 páginas! Mas quanto penou aquele autor para escrever tanto e tão bem? No final do livro ele explica: trabalhando com afinco e percebendo que há um tempo para dar o trabalho como acabado.
O perfeccionismo é como um culto dentro da comunidade de designers e criativos, que não perderá nenhuma oportunidade de criticar à mínima falha. Não é por acaso que sentimos maior nervosismo em mostrar um trabalho a um designer do que a um cliente!
Talvez possamos aprender alguma coisa com os surfistas de alma. Segundo a Wikipedia, «Soul Surfer (surfista de alma) é um termo inventado na década de 1960, usado para descrever um surfista que surfa apenas e só por puro prazer. Embora possam entrar em competições, ganhar não é o principal motivo do surfista de alma».
É isso que sinto em relação à imperfeição na criatividade e no design. Não devemos abraçar um projeto para alcançarmos a perfeição e a total ausência de falhas e críticas, mas antes porque gostamos / amamos o que fazemos, porque temos prazer e realização no trabalho e porque, não fazê-lo é atentar contra nós mesmos.
E acredite que não acho que o perfeccionismo seja algo absolutamente mau ou ruinoso, mas se o estiver a impedir de terminar (ou até de começar) alguma coisa, então, está na hora de descartá-lo!